Por Carla Ricchetti e André Gonçalves Zipperer*

Além de toda a aceleração tecnológica por conta dos impulsos da inteligência artificial e aprendizado de máquina, estamos vivenciando um processo de mudança cultural pelo qual progresso é sinônimo de produtividade e rapidez na execução.

  Novos algoritmos e aplicativos vêm sendo criados todos os dias para que se tente alcançar a maior produtividade no menor tempo, com o menor esforço e mais alto grau de acerto possíveis. Em um ambiente de alta competitividade comercial e profissional, no qual a velocidade das decisões influi diretamente no resultado dos negócios, a busca por este tipo de tecnologia aumenta a cada dia.

  Mas como isso funciona no campo da administração de pessoas? Será que amanhã seremos gerenciados por algoritmos ou robôs?

  Um estudo recente feito em parceria entre a Oracle e Future of Work Place mostrou que 64% das pessoas de fato confiam mais em chefes robôs do que em pessoas. Segundo esta pesquisa, no Brasil, essa porcentagem é ainda maior, de 78%.

 

A pesquisa também investigou os aspectos pelos quais estas pessoas prefeririam um ao outro. Assim, os aspectos nos quais os robôs seriam melhores seriam: gestão de informação e tomada de decisões sem viés, sempre a partir de critérios e dados consistentes e evitando qualquer preferência pessoal; resolução de problemas; e administração de orçamentos.

   Por outro lado, os aspectos apontados pelos quais os gerentes humanos pessoas seriam melhores são: atividade como liderança e treinamento pessoal, desenvolvimento de empatia, a compreensão dos sentimentos; e a criação de uma cultura organizacional laboral. Todas essas são competências humanas que são específicas de serem codificadas com precisão por meio de algoritmos.

  Tecnologias são ferramentas importantes para realização de tarefas repetitivas, analíticas, perigosas e insalubres. Já as tarefas que exijam as chamadas soft skills, altamente valorizadas por se ligarem a valores como liderança, treinamento, empatia, criatividade e julgamento, deverão ser executadas por seres humanos.

  Paul Daugherty, tecnologista da empresa Accenture, no seu livro “Humano + Máquina”, sobre inteligência artificial e trabalho, separa em quatro listas: atividades que só podem ser realizadas por humanos; aquelas podem ser realizadas por máquinas com mais eficiência; tarefas em que a tecnologia complementa o trabalho feito por pessoas; funções nas quais a inteligência artificial dá superpoderes para os homens.

André Gonçalves Zipperer é Doutor em Direito pela PUC-PR. Pesquisador do
Getrab-USP e professor universitário. Autor de diversos artigos e livro sobre
trabalho e tecnologia.
André Gonçalves Zipperer

  Ao falar sobre humanos com superpoderes, o autor está se referindo à capacidade de resolver problemas, ao pensamento crítico, à criatividade, à gestão de pessoas e de cultura; às decisões e os julgamentos, à inteligência emocional, e à persuasão e negociação.

Curiosamente, ao compararmos esta lista com aquela trazida pelo Fórum Econômico Mundial, em estudo divulgado no último mês de outubro sobre o futuro do trabalho (“Future of Jobs 2020”), todas estas habilidades estão entre as top skills entendidas como as mais importantes no ano de 2025.

Este mesmo estudo traz aspectos positivos da tecnologia, muito além do senso comum de que robôs e algoritmos ameaçariam empregos. Além de ajudarem a eliminar atividades perigosas, repetitivas e insalubres, trazem mais eficiência e rapidez e podem também ser parte de uma solução por meio da melhoria nos treinamentos e na capacidade de análise, fornecendo dados mais apurados e perspectiva mais ampla.

  Estamos em uma fase de transição conturbada durante a qual muitos ajustes ocorrerão. Como todo processo de transição, teremos erros e acertos. A pandemia acelerou bastante este processo, fazendo com que tenhamos que nos adaptar sem tempo de reflexão.

  Entendemos que duas questões ganham importância: pesados investimentos em educação de qualidade, a preparar as pessoas para as novas atividades que surgirão focado em soft skills humanas — empatia é matéria escolar obrigatória hoje na Dinamarca, por exemplo — e conteúdos acadêmicos técnicos em linha com as necessidades de impulsionar novas tecnologias, assim como uma construção legislativa moderna, propositiva, técnica, que evite a tecnofobia para equilibrar esse processo da forma mais eficaz e harmônica possível.

  É compreensível que a mudança repentina do status quo acabe impondo uma insegurança econômica, política e social muito grande. No entanto, acreditamos que, como toda a lei de mercado, haverá um ponto de equilíbrio no qual teremos como a harmonização do homem com a máquina e a inteligência artificial centrada no humano, servindo para dotá-lo de mais qualidades.

  O empreendedor e autor Gino Wickman tem, talvez, a melhor forma de dizê-lo. “a tecnologia deve sistematizar o que é previsível para que os seres humanos possam humanizar o que é excepcional”, afirma. Nós não teríamos como explicar melhor.

* Carla Ricchetti é responsável pela área de investimentos da International

Finance Corporation (IFC) – braço do Banco Mundial. Mestre pela Columbia

University. Programa Executivo em Inteligência Artificial pelo MIT.

* André Gonçalves Zipperer é Doutor em Direito pela PUC-PR. Pesquisador do

Getrab-USP e professor universitário. Autor de diversos artigos e livro sobre

trabalho e tecnologia.

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