Primeiro Capítulo de A Vila, livro best-seller na Amazon da escritora brasileira Ana Carolina Kherlakian.
Os livros da Ana Carolina Kherlakian tem tido excelente repercussão na Amazon.
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Capítulo 1
Anchorage
Pisei fundo no acelerador em direção à estrada Seward. Tudo o que eu desejava naquele momento era sair daquela casa maldita e pular dentro de um portal mágico, como nos livros de ficção que eu escrevia. A voz ecoando em minha mente devorava cada espaço do meu coração. “Eu estou apaixonado por ela, Nicole. Não posso mais ficar com você, não posso mais fingir!”
— Fingir! Desgraçado! — Bati as mãos trêmulas no volante. Lágrimas secas queimaram o meu rosto.
Oito anos de casamento jogados no lixo. Cada momento de alegria, manchado pela dor imensurável que eu sentia. Era tudo uma mentira. O amor dele por mim era uma mentira. Engoli a amargura, como se fosse um veneno. Eu havia me desfeito de uma vida em Nova Iorque para vir morar com ele no Alasca. Uma verdadeira idiota.
Olhei para estrada escura, a luz dos faróis iluminando o caminho sem fim. A nevasca, antes inofensiva, começava a ganhar força. Flocos de neve deslizavam pelo vidro como o líquido quente inundando a minha face. Observei a mesma paisagem por um tempo incalculável; o breu infinito à minha frente tornava-se cada vez mais sombrio, nebuloso, como os meus pensamentos. As palavras martelando em minha cabeça não me deixavam em paz. “Ela está grávida, Nicole. Finalmente vou ser pai.” Um gemido escapuliu de minha boca. Eu nunca consegui ser mãe! Toda tentativa havia sido inútil, um desperdício que me custou em todos os sentidos. Eu sou mesmo uma tonta! Como pude não notar? Como pude ser tão cega? A culpa me corroeu por dentro, a raiva desmensurada me fez acelerar ainda mais.
— Mas o que…? — Minha voz falhou.
Um brilho intenso surgiu uns 100 metros adiante. Diminuí a velocidade aos poucos, mas sabia que não ia dar tempo de parar. À medida que fui me aproximando, percebi abismada a figura de um cervo. Sai! Sai da frente! Estranhamente, o animal reluzia, seus olhos escuros me encarando com afinco.
— Não! — gritei, apavorada.
Tudo aconteceu muito rápido. Girei o volante com força para a esquerda. O Range Rover capotou, mergulhando em um abismo enevoado. Um misto de pavor e adrenalina percorreu o meu sangue. Ouvi um baque, depois o silêncio mortal.
***
Naquele momento decisivo, a minha vida não passou diante dos meus olhos, como sempre diziam que acontecia. Em vez disso, minha mente revisitou um único momento no passado. Um momento escondido, em algum lugar dentro de mim. Eu me vi criança, dentro de um quarto sem graça, sentada sobre um tapete cor de palha. A boneca em minhas mãos me encarava como se estivesse viva.
— Você é a única que me entende. A única que olha para mim de verdade. — A voz infantil soou distante, a lembrança se tornou difusa.
A imagem deu lugar à escuridão. Depois de algum tempo, comecei a ouvir a minha própria respiração. Ao abrir os olhos, demorei para me situar. Clarões do acidente tomaram a minha consciência. O medo acelerou o meu coração. Um cervo! Um maldito cervo! Respirei fundo e olhei ao redor. A janela ao meu lado havia se partido, e percebi neve e cacos de vidro amontoados em meu colo. Ergui a mão direita com dificuldade e a levei sobre o meu couro cabeludo, em direção à dor. Senti uma sensação molhada estranha. Quando puxei a mão de volta, vi o sangue escorrer em meus dedos.
— Deus… — murmurei, angustiada.
Desatei o cinto de segurança e tentei alcançar a minha bolsa no chão do banco ao meu lado. Com cuidado, inclinei-me na direção do banco de passageiro, tateei ao redor, mas meus dedos não encontraram nada. Uma dor aguda no ombro me fez recuar. Apertei os olhos e respirei fundo. A bolsa deve ter parado em outro lugar. Preciso do meu celular! Deitei a minha poltrona o máximo que pude, estendi o braço em direção ao banco de trás e… nada.
— Droga! — Bufei, notando outra janela quebrada do lado esquerdo. Será que ela caiu para fora? Puxei a alavanca na lateral da minha poltrona, erguendo-a novamente. Do lado de fora da janela quebrada, a escuridão parecia assustadora… mas havia uma lanterna no porta-luvas. Mirei o feixe de luz no breu ao redor e avaliei a minha situação. O carro havia parado sobre um barranco coberto de neve, e árvores altas percorriam a sua extensão. A porta estava bloqueada por uma barreira de gelo, e tive que usar toda a minha força para abri-la. Consegui! Sorri com desespero. Acho que dá para passar. Com cuidado, enfiei a cabeça e depois o corpo no pequeno espaço da porta semiaberta. O penhasco não é tão íngreme assim. Notei aliviada, enquanto deslizava para fora, me segurando em um galho.
— Meu Deus! — exclamei, atônita.
Sentada na neve, conseguia observar melhor o tamanho do estrago do automóvel. Teto e portas esmagadas, calotas arrancadas. A capota estava aberta, e o cheiro de diesel pairava no ar. Preciso me afastar. O alerta em minha cabeça foi um aditivo para me erguer rapidamente. Minhas botas afundaram na neve fofa. Será que ainda dá pra achar a bolsa? Olhei receosa para o automóvel e arrisquei um passo à frente, entretanto, na mesma hora, sobressaltei-me com a explosão vinda do interior da capota. Dei um grito e quase caí para trás. Em desespero, girei o meu corpo cansado em direção à estrada e comecei a subir o barranco o mais rápido que conseguia, não sem muito esforço. O ruído estrondoso das explosões continuou. Eu tentei não olhar para trás, firmando os meus passos, até que senti o meu pé direito esbarrar em algo. A bolsa!
— Graças a Deus! — Ela tinha caído de cabeça para baixo. Enfiei a minha mão lá dentro, dando conta da ausência do celular. Não acredito! Apenas a enorme carteira guardada no compartimento lateral, e outras coisas inúteis. — Mas que droga! — xinguei alto, me recriminando por andar com uma bolsa sem zíper. O celular deve ter caído em algum lugar.
Esperançosa, iluminei a neve ao redor com a lanterna, foquei em cada canto, mas infelizmente, não havia nada… nada de celular. Estou ferrada! Meu corpo tremeu de ódio e frio. Gemi resignada, cruzei a alça da bolsa no meu peito e continuei o meu percurso. Cada passo, um desafio.
— Você consegue. Você consegue. — Eu repetia o mantra positivo para mim mesma, enquanto mirava o feixe de luz no vazio lúgubre.
***
Quando finalmente cheguei na beira da estrada, meu coração estava tão acelerado que eu precisei me sentar no chão gélido para tentar me recompor. O frio intenso só aumentava o meu cansaço. Protegi os meus olhos da nevasca opressiva com a mão esquerda e, usando a outra mão, iluminei o cenário sombrio. Não havia sinal de carro, caminhão, nada além de trevas. A quietude do lugar parecia tão assustadora quanto a minha situação. O que eu vou fazer agora? Se eu ficar aqui muito tempo, vou congelar!
— Que dia maldito! — Minha voz ecoou na vastidão escura. A frustração embrulhava o meu estômago. Em um surto de raiva, chutei uma pedra de gelo, arremessando-a na estrada. — O que eu fiz…? — lamentei, tremendo.
Tentei respirar fundo. O ar glacial entrou em meus pulmões fazendo-me tossir. Naquele momento tenso de inconformismo, ouvi um barulho: um ruído de folhas e passos, tornando-se cada vez mais nítidos. De súbito, uma luz se acendeu, e estreitei o olhar para a criatura à minha frente, paralisada diante da imagem inesperada. O cervo!
Podia ser a adrenalina, ou o cansaço embaralhando meus sentidos, mas o animal brilhante e imponente do outro lado da estrada não se parecia com um cervo comum. Chifres majestosos reluziam como ouro, e uma espécie de aura fluía de seu corpo. Eu me ergui do chão, sem desviar os olhos da visão surreal. Ele está me encarando? Estranhei, notando seu olhar intenso queimar em minha direção. Estou delirando. Apertei os olhos, mas o animal continuava ali, hipnotizando-me com seu fulgor mágico. Uma parte de mim desejava segui-lo, outra parte (a racional) dizia-me para ter paciência e esperar um transporte passar na estrada. Contudo, uma voz interior, a voz do coração, assoviava em meus ouvidos. Siga-o, Nicole.
Havia algo no olhar dele, algo emanando segurança, calor e paz. Tudo rodou em câmera lenta. Eu me vi atravessando a estrada com a leve sensação de estar sendo observada, impulsionada por uma força além da minha compreensão. Embrenhei-me em um vale gélido e serrado. Galhos secos recortavam um caminho selvagem e irregular. O cervo mantinha o seu ritmo tranquilo, como se soubesse o propósito daquela caminhada. Ele era o meu guia, e por mais louca e perigosa que a situação parecesse, naquele momento, eu me sentia mais calma.
Ana Carolina Kherlakian
Criar é a palavra que define Ana Carolina Kherlakian como pessoa – seja na escrita, na música, ou na arte. A música e a literatura sempre atraíram Ana Carolina. A paixão por tocar piano, cantar e ler surgiram desde muito cedo em sua vida.
A partir disso, Kherlakian decidiu cursar faculdade de Comunicação e Marketing a fim de se profissionalizar na área de criação. Durante anos, Ana trabalhou no comércio, auxiliando seus pais na área de marketing de suas lojas e chegou a abrir uma loja própria, o que a levou a uma nova aventura: o design de joias.
Ainda assim, Ana Carolina sentia uma necessidade ainda maior de ter a criação em sua vida e a escrita passou a se fazer presente cada vez mais em sua história.
A ideia de escrever seu primeiro romance (Amor Imortal) surgiu após ter diversos livros e a paixão pela literatura fantástica veio para ficar na vida desta leitora voraz. Era o início de uma carreira que a completou em todos os sentidos. Sempre dedicada aos temas de seus interesses, há muitos anos Ana estuda metafísica.
Em 2015, Ana Carolina Kherlakian lançou seu primeiro romance de ficção, Amor Imortal. A continuação da história, Eternidade, está disponível na Amazon, além do conto épico Raziel. Também é autora do romance stand alone Além dos Sentidos e do best-seller A Vila – um momento pode mudar tudo.
Na Amazon, já teve 27.000 exemplares pedidos de suas obras e, apenas para o livro A Vila, foram mais de 10.000 livros pedidos – o que fez com que este best-seller ganhasse sua versão em inglês, também disponível na Amazon: The mistery of the Village – one moment can change everything.
Seu lado criativo e místico estão presentes em todas as suas obras. Mora em São Paulo com seu marido e seu filho. Ana Carolina é representada pela Authoria Agência Literária & Studio.
Para saber mais sobre Ana Carolina Kherlakian, acesse:
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